Há muito tempo que eu não escuto uma expressão popular usada insistentemente pelos moradores da região do Cariri, por volta das décadas de 1950 e 1960: “Quem vai pela cabeça dos outros é piolho.” Era equivalente a outra sabedoria de pára-choques de caminhão, “Se conselho fosse bom era vendido...” Ambas estão em desuso, talvez por influência dos modernos escritórios de consultoria que vendem seus conselhos para empresas multinacionais, que os compram a peso de ouro, para que depois, nós paguemos a conta. De minha parte, toda vez que eu fui pela cabeça dos outros, terminei de uma forma ou de outra “quebrando a cara.”
Nos primeiros anos da década de 1980, o Rotary Clube do Crato trouxe à nossa cidade um famoso psicólogo de Fortaleza para aconselhar os casais cratenses. Como bom rotariano que éramos, eu e Magali comparecemos. Foi numa tarde de um sábado, com auditório lotado de casais, onde muitos ensinamentos foram derramados por aquele mestre das ciências da alma. Numa palestra bastante agradável, o psicólogo, que também era sacerdote católico, discorreu sobre sexo, como viver em harmonia e principalmente a educação e formação dos nossos filhos. Enfim, coisas que todo pai e mãe desejam e gostam de ouvir para imediatamente porem em prática. Entre os muitos conselhos que ele nos deu, havia um aparentemente pertinente. “Levem os filhos qualquer dia ao local de trabalho, para que eles vejam a luta de vocês para ganhar o pão.”
Na semana seguinte, numa bela tarde, lá ia eu em direção à Coelce, meu local de trabalho, acompanhado pelos meus três filhos, com idade de oito, seis e quatro anos, respectivamente. Ao chegarem, desceram do carro feito loucos, correram pelos corredores e jardins, visitaram todas as salas e numa fração de segundo exploraram todos os pontos da repartição, um prédio de dois pavimentos, que ocupava quase um quarteirão. Depressa descobriram a cantina e eu os apresentei ao dono, dizendo que servisse tudo que eles quisessem. No final do expediente, faria o pagamento das despesas. Quanta coragem! Mas era assim que eu pensava: deixando-os livres, poderia ter um pouco de sossego e trabalhar com tranqüilidade.
Vez por outra, eles subiam ao andar superior, abriam a porta da minha sala de trabalho, olhavam de soslaio e desapareciam em seguida. Lá pelas quatro horas, o mais novo deles, cansou e sentou-se por alguns minutos num sofá defronte ao meu birô. Continuei trabalhando, atendendo ao telefone, recebendo clientes e registrando alguns dados para ordens de serviços. E o caçula, sentado ali, balançando as perninhas e observando tudo. Quando eu o olhava, ele sorria meio desconfiado.
Finalmente, o dia terminou e antes de sair, lembrei-me de pagar a conta que eles fizeram na cantina. Puxa! Que conta salgada! Os três consumiram todo o estoque de chocolates, bombons, sorvetes e comeram sanduíches por um ano inteiro, para felicidade do cantineiro, que nunca havia vendido tanto em tão breve espaço de tempo.
Mas ao chegar à nossa casa, é que notei a grandiosa besteira que fiz, indo pela cabeça daquele psicólogo. Ao receber as crianças, Magali exclamou para eles: “Ih! Passaram a tarde toda vendo o papai trabalhar...” Ao que o mais novo, aquele que demorou alguns minutinhos descansando na poltrona à minha frente, respondeu: “Papai não trabalha, não. Passa o tempo todo atendendo telefone e escrevendo uma cópia, sem olhar para nenhum livro...”
É isso mesmo! Eu mereci!... Quem mandou ir pela cabeça de psicólogo? Grande piolho é o que eu fui!
Por Carlos Eduardo Esmeraldo
Nos primeiros anos da década de 1980, o Rotary Clube do Crato trouxe à nossa cidade um famoso psicólogo de Fortaleza para aconselhar os casais cratenses. Como bom rotariano que éramos, eu e Magali comparecemos. Foi numa tarde de um sábado, com auditório lotado de casais, onde muitos ensinamentos foram derramados por aquele mestre das ciências da alma. Numa palestra bastante agradável, o psicólogo, que também era sacerdote católico, discorreu sobre sexo, como viver em harmonia e principalmente a educação e formação dos nossos filhos. Enfim, coisas que todo pai e mãe desejam e gostam de ouvir para imediatamente porem em prática. Entre os muitos conselhos que ele nos deu, havia um aparentemente pertinente. “Levem os filhos qualquer dia ao local de trabalho, para que eles vejam a luta de vocês para ganhar o pão.”
Na semana seguinte, numa bela tarde, lá ia eu em direção à Coelce, meu local de trabalho, acompanhado pelos meus três filhos, com idade de oito, seis e quatro anos, respectivamente. Ao chegarem, desceram do carro feito loucos, correram pelos corredores e jardins, visitaram todas as salas e numa fração de segundo exploraram todos os pontos da repartição, um prédio de dois pavimentos, que ocupava quase um quarteirão. Depressa descobriram a cantina e eu os apresentei ao dono, dizendo que servisse tudo que eles quisessem. No final do expediente, faria o pagamento das despesas. Quanta coragem! Mas era assim que eu pensava: deixando-os livres, poderia ter um pouco de sossego e trabalhar com tranqüilidade.
Vez por outra, eles subiam ao andar superior, abriam a porta da minha sala de trabalho, olhavam de soslaio e desapareciam em seguida. Lá pelas quatro horas, o mais novo deles, cansou e sentou-se por alguns minutos num sofá defronte ao meu birô. Continuei trabalhando, atendendo ao telefone, recebendo clientes e registrando alguns dados para ordens de serviços. E o caçula, sentado ali, balançando as perninhas e observando tudo. Quando eu o olhava, ele sorria meio desconfiado.
Finalmente, o dia terminou e antes de sair, lembrei-me de pagar a conta que eles fizeram na cantina. Puxa! Que conta salgada! Os três consumiram todo o estoque de chocolates, bombons, sorvetes e comeram sanduíches por um ano inteiro, para felicidade do cantineiro, que nunca havia vendido tanto em tão breve espaço de tempo.
Mas ao chegar à nossa casa, é que notei a grandiosa besteira que fiz, indo pela cabeça daquele psicólogo. Ao receber as crianças, Magali exclamou para eles: “Ih! Passaram a tarde toda vendo o papai trabalhar...” Ao que o mais novo, aquele que demorou alguns minutinhos descansando na poltrona à minha frente, respondeu: “Papai não trabalha, não. Passa o tempo todo atendendo telefone e escrevendo uma cópia, sem olhar para nenhum livro...”
É isso mesmo! Eu mereci!... Quem mandou ir pela cabeça de psicólogo? Grande piolho é o que eu fui!
Por Carlos Eduardo Esmeraldo